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Lula quer resgatar velha “Petrobras” para tocar projetos do governo – @gazetadopovo



Magda Chambriard, indicada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tornou-se a nova presidente da Petrobras, consumando a oitava troca na presidência da estatal nos últimos oito anos. A mudança foi concretizada nesta sexta-feira (24), com a eleição da engenheira pelo conselho de administração da estatal.

A nomeação de Chambriard – que assume o lugar do demitido Jean Paul Prates – busca tornar realidade um antigo desejo do PT para a maior empresa, arrecadadora de impostos, investidora e geradora de dividendos do país. A ideia de Lula é resgatar a “velha Petrobras”, aquela dos primeiros governos petistas, menos preocupada com eficiência e lucratividade e mais “nacionalista” e “desenvolvimentista” – e que acumulou perdas bilionárias com preços abaixo de mercado, investimentos antieconômicos e escândalos de corrupção revelados pela Operação Lava Jato.

O presidente vinha cobrando essa postura da estatal desde o início do governo. “A Petrobras, que no nosso tempo era uma empresa de desenvolvimento do nosso país, agora é uma empresa exportadora de óleo cru. Não foi para isso que nós descobrimos o pré-sal”, disse Lula em março de 2023.

A gestão de Prates, que é filiado ao PT, já caminhava na direção desejada pelo Planalto, mas a cúpula do governo deixou claro que quer acelerar o passo. E que não quer ser contrariada. Não foram poucos os episódios em que o ex-presidente da empresa trocou farpas públicas com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que teve papel decisivo na demissão.

A estratégia de uma “estatal indutora do desenvolvimento” caminha em paralelo com projetos como o Nova Indústria Brasil, que retoma ideias como subsídios e metas de conteúdo local.

Lula também já relevou o desejo de que as empresas privadas trabalhem conforme o pensamento dele: “O que nós queremos é o seguinte: empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo brasileiro”, disse o presidente em fevereiro.

Hugo Garbe, professor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, destaca um certo déjà vu na troca de presidência da estatal, expressando preocupação com a possibilidade de novos episódios de corrupção.

Segundo o CEO do Instituto Millenium, Wagner Lenhart, já se teve a oportunidade de observar uma Petrobras mais nacionalista, intervencionista e refém do Planalto.

“No passado, essa doutrina nacionalista-intervencionista trouxe custos altos, desempenho operacional ruim, aquisições a preços elevados e retornos baixos, subsídios aos preços dos combustíveis e o título de empresa mais endividada do mundo ao final de 2014, após quatro anos seguidos de preços de petróleo acima de US$ 100 por barril. Sem falar dos escândalos de corrupção noticiados pela mídia”, destaca.

Lula quer que Petrobras seja indutora do crescimento nacional

Lula deseja que a Petrobras impulsione o crescimento nacional com projetos de viabilidade discutível. Nas gestões anteriores do PT, grandes quantias foram dilapidadas e, somadas aos escândalos de corrupção, contribuíram para prejuízos recordes em 2014 e 2015, totalizando R$ 66,3 bilhões em perdas.

Tornar a Petrobras uma indutora do crescimento nacional só seria possível em um cenário em que a economia fosse bem menor do que ela é, apontam analistas ouvidos pela Gazeta do Povo.

“Mas o Brasil tem uma economia complexa. Crescimento econômico é gerado principalmente por investimentos em educação e os ganhos de produtividade causados por inovações e a alocação eficiente de capital”, diz Lenhart.

O Palácio do Planalto quer avançar em projetos considerados “estruturantes”, como a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, inicialmente orçada em US$ 2,3 bilhões e ainda não concluída após consumir mais de US$ 18 bilhões.

A empresa anunciou em janeiro, com direito a cerimônia festiva na presença de Lula, a retomada nas obras da refinaria. A ideia é elevar a capacidade de refino, hoje em 100 mil barris diários, para 230 mil barris por dia, com desembolso estimado entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões.

Outro projeto considerado estruturante pelo governo é o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), inicialmente orçado em US$ 6,1 bilhões, mas que consumiu US$ 13,5 bilhões até 2014, um ano antes de o projeto ser interrompido. O Comperj também foi alvo de denúncias de corrupção e considerado antieconômico no governo Michel Temer (MDB).

Segundo o jornal “Valor”, Chambriard reuniu-se com o ministro Silveira, na semana passada. Na pauta, estavam investimentos na ampliação de fábricas de fertilizantes. Uma das ações de curto prazo é a reativação da fábrica de fertilizantes de Araucária (PR), além das unidades da Bahia e Sergipe, atualmente com a Unigel, e a conclusão da planta de Mato Grosso do Sul, cujas obras foram paralisadas em 2015, com 80% de avanço.

Luiz Carvalho, head de análise de óleo e gás do banco suíço UBS, ressaltou em live realizada pelo portal especializado EPBR que a produção de fertilizantes é mais uma questão de vontade política do que de competitividade do país no segmento. O objetivo seria aproveitar a grande demanda existente no Brasil, um dos maiores produtores mundiais de alimentos e grande importador de fertilizantes.

Os fertilizantes e o refino, ao lado do gás, serão três das principais obrigações que Chambriard terá à frente da Petrobras, disse Silveira em entrevista ao jornal “O Globo”. “Ninguém em sã consciência aceitaria um desafio conhecendo a visão do governo, inclusive a do ministro de Minas, se tivesse visão diferente”, afirmou o ministro. “Ela tem outras obrigações com o investidor e com o Brasil: gás, fertilizantes e refino.”

O governo também tem interesse em que a Petrobras faça encomendas à
indústria naval brasileira para reativá-la. O “Valor” informa que Lula e o
presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES),
Aloizio Mercadante, já alinharam o discurso. O BNDES planeja desembolsar R$ 5
bilhões este ano para os estaleiros, com recursos do Fundo de Marinha Mercante.

Carvalho lembra que experiências passadas com contratações locais não foram bem-sucedidas na Petrobras e podem ser contraproducentes na atual conjuntura. Segundo ele, tais contratações só fariam sentido se a exploração de petróleo estivesse em crescimento acentuado. “É preciso entender que o Brasil não será competitivo do parafuso ao casco do navio.”

O CEO do Instituto Millenium complementa dizendo que a imposição de índices de conteúdo local implica na concessão de poder de monopólio para fabricantes locais, em prejuízo da Petrobras – que assim fica obrigada a adquirir, no Brasil, navios a preços muito mais altos do que no exterior, como na China, Coreia do Sul e Japão, e com defasagem tecnológica.

Petrobras é mais eficiente na extração de petróleo

Segundo Bruno Corano, da Corano Capital, a Petrobras tem como essência a extração de petróleo. “Ela nunca demostrou eficiência nas tentativas de refinação, ou seja, gerir a refinaria, quanto em qualquer outra frente. Todas as vezes que a empresa saiu dessa essência dela, isso gerou perdas e não rendeu”, diz.

O professor do Mackenzie diz que o investimento em projetos questionáveis pode comprometer a empresa no longo prazo. Haveria uma demanda de tempo, dinheiro e energia com outras frentes, em meio a um cenário de queda nos lucros da empresa. No primeiro trimestre de 2024, o resultado líquido foi de R$ 23,7 bilhões, 37,9% abaixo do registrado no mesmo período do ano passado.

Corano destaca que, para melhorar a performance financeira, a empresa precisa repassar a flutuação do preço do petróleo que ela vem retendo. Levantamento feito na quarta-feira pela Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) aponta que a defasagem no preço da gasolina em relação à cotação internacional é de 5% e a do diesel, de 3%.

“De qualquer forma, o preço do petróleo caiu, comparada aos últimos anos e ao período de pós-pandemia. O preço arrefeceu. Mas a Petrobras é ainda é mais prejudicada porque existe uma contenção de repasse, por interesses políticos, para não pressionar a inflação”, diz o analista.

Chambriard vai assumir a Petrobras em momento desafiador

Segundo a XP Investimentos, a executiva assume o cargo em um “contexto
desafiador com significativas pressões externas”, mas encontrará a empresa em
uma posição financeira robusta, com forte geração de caixa, balanço patrimonial
desalavancado e um sólido portfólio de investimentos.

Corano aponta que o principal desafio de Chambriard ao assumir o comando da
Petrobras será conciliar os interesses da empresa – mercado e acionistas – com
as políticas do atual governo.

As principais pressões externas originam-se do conturbado cenário
geopolítico internacional, com a guerra entre Rússia e Ucrânia, o conflito
armado entre Israel e o grupo terrorista Hamas e as tensões no Leste da Ásia
entre China e Taiwan. O preço do barril de petróleo tem mostrado volatilidade,
oscilando entre US$ 70 e US$ 100 desde o início do ano.

A inflação na cadeia de suprimentos do setor de óleo e gás também preocupa. Sérgio Leite, ex-diretor financeiro da Petrobras, relatou em uma teleconferência sobre os resultados do primeiro trimestre, realizada no dia 14, que a cadeia está sob intensa pressão, enfrentando dificuldades para acompanhar a demanda das empresas, além de problemas de liquidez e estrutura de financiamento. Naquele mesmo dia, Leite foi demitido, junto com Prates.

Chambriard enfrentará desafios cruciais, como a contratação de plataformas previstas para operação nos próximos anos e questões de licenciamento ambiental. Licitações para o afretamento de plataformas fracassaram, e a construção de unidades próprias está em análise pela empresa, considerando a alta taxa de conteúdo local exigida.

Problemas relacionados ao licenciamento ambiental podem afetar negativamente a produção brasileira deste ano, com a Petrobras estimando um impacto de até 2%. A produção média prevista para este ano é de 2,8 milhões de barris de petróleo por dia. Servidores do Ibama estão em operação padrão desde janeiro, o que tem atrasado o calendário de perfuração de poços de desenvolvimento e campanhas de levantamento sísmicos.

A nova CEO também terá o desafio de expandir as áreas de exploração de petróleo e gás, incluindo a Margem Equatorial. Sem novas frentes de extração, a produção brasileira pode sofrer redução a partir de 2028. Chambriard questiona as ações da Funai e do Ibama quanto ao licenciamento inicial para poços na foz do Rio Amazonas.



Acesse esta notícia no site do Gazeta do Povo – Link Original

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