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Para José Marcos Sarabia, Paraguai é exemplo de sistema tributário – @gazetadopovo


Parece estranho alguém se orgulhar de ser o maior pagador de impostos de um país. Mas o empresário José Marcos Sarabia, de 60 anos, fala com satisfação sobre os mais de R$ 100 milhões que seu grupo empresarial paga, todo ano, de imposto de renda como pessoa jurídica no Paraguai.

O engenheiro agrônomo Sarabia instalou-se no país vizinho há 31 anos, munido apenas de um fusca 1969 e de US$ 20 mil (cerca de R$ 100 mil atualmente), capital levantado com a venda de um apartamento em Londrina que possibilitou abrir uma distribuidora de defensivos agrícolas. Hoje ele comanda um grupo empresarial que detém 28% do mercado paraguaio de pesticidas e lidera a comercialização de grãos no país. Emprega mais de 2 mil funcionários, 700 deles de nível superior, em três empresas – Agrofertil, Tecnomyl e Agropecuaria Campos Nuevos.

“Eu tenho experiência na Argentina, Bolívia, Paraguai e Brasil. E para mim, sem dúvida nenhuma, o Paraguai é o país mais fácil de todos para se trabalhar. Faz 80 anos que não muda a moeda, o guarani, e a inflação fica em torno de 5% a 7% ao ano. Podemos movimentar as contas em dólar, temos zero de preocupação com o câmbio”, diz.

Paraguai tem sistema tributário descomplicado

“Na parte tributária, qualquer pessoa entende a contabilidade. Tem 10% de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), 1% de imposto de renda na pessoa física e 10% na pessoa jurídica. O custo com funcionário é de 16%. Um recém-formado entende como funciona a parte tributária no Paraguai”, aponta Sarabia.

O empresário acaba de lançar uma autobiografia, “Sementes do Sucesso”, em que narra sua trajetória, desde o garoto que viveu parte da infância num sítio sem energia elétrica em Ibiporã (PR) até chegar ao status de maior empresário do Paraguai. No mês passado ele inaugurou mais uma fábrica, acompanhado pelo presidente da República Santiago Peña, que escreveu o prefácio de seu livro.

“José Marcos Sarabia é um exemplo paradigmático de que o Paraguai é um país que acolhe com generosidade os estrangeiros que aqui vêm para investir, desenvolver-se e crescer – particularmente, irmãos de países vizinhos como o Brasil”, escreveu Peña. “Sua história pessoal é, em muitos aspectos, a história do setor agrícola nas últimas décadas, nas quais o Paraguai se tornou um dos mais importantes produtores de alimentos do mundo”, destacou o presidente paraguaio.

Grupo Sarabia cresceu com clientes brasiguaios

De fato, Sarabia e seus irmãos, que viraram sócios nos
empreendimentos, cresceram aproveitando oportunidades junto a produtores
brasileiros, que cultivam cerca de 70% das terras agrícolas no país. Como bom
vendedor, Sarabia visitava fazenda por fazenda, procurando fazer amizade com
seus compatriotas e entender as necessidades de cada cliente.

Quando se estabeleceu do outro lado da fronteira, em 1993, recorda, o Paraguai era visto como um lugar inseguro, com fama de abrigar contrabandistas e falsificadores de produtos. “Naquela época também eram comuns roubos de veículos brasileiros para serem vendidos do outro lado da fronteira, o que piorava a imagem paraguaia. Minha família e meus amigos consideravam uma loucura eu deixar um emprego que pagava bem, com carro e despesas de viagens por conta da empresa, para migrar para o país vizinho”, conta.

Ainda hoje, observa Sarabia, muitos brasileiros não veem o Paraguai com bons olhos. “Quando ouço comentários negativos, digo: ‘Continuem pensando assim, porque teremos menos concorrência por aqui’. Claro que é uma brincadeira. Frequentemente, contribuo com a Embaixada do Brasil, em Assunção, para relatar minha trajetória em eventos com o objetivo de atrair empresários brasileiros”, relata.

Empresas de José Marcos Sarabia devem faturar R$ 2,5 bilhões neste ano no Brasil
Empresas de José Marcos Sarabia devem faturar R$ 2,5 bilhões neste ano no Brasil| Divulgação / Grupo Sarabia

Paraguai se transformou e visão que brasileiro tem do país é errada

Veja, abaixo, alguns trechos da entrevista que José Marcos Sarabia concedeu à Gazeta do Povo.

Como era o Paraguai que você encontrou no início dos anos 1990, e como é o Paraguai hoje?

Paraguai era um país, na área agrícola, com muito pouca estrutura. As estradas nem eram cascalhadas, eram de terra. O país foi se desenvolvendo, talvez de forma similar ao Paraná, mas uns 20 anos atrasado. Hoje o Paraguai melhorou muito em termos de infraestrutura, de estradas, pontes e acesso ao agricultor. É totalmente diferente de 30 anos atrás. Naquela época não tinha telefone, era só radiocomunicador, e quando chovia ficava uma semana sem comunicação.

Como foi a evolução do ambiente de negócios no Paraguai?

O Paraguai é um país fácil, um país onde qualquer pessoa entende a contabilidade. Tem 10% de IVA, 1% de imposto de renda na pessoa física e 10% na pessoa jurídica. Só isso. Um recém-formado vai entender a parte tributária do Paraguai.

Eu também tenho empresas no Brasil, que é muito mais complexo na parte tributária. O custo sobre funcionário no Paraguai é de 16%. Na parte de ações trabalhistas, são muito poucas. Uma coisa relevante é que o Paraguai tem energia de sobra. Utiliza entre 25% ou 28% da energia, o resto ele vende para o Brasil.

A visão que o brasileiro sempre teve do Paraguai é errada. Em uma de nossas empresas, a Tecnomyl, que fica em Villeta, perto de Assunção, eu tenho 450 funcionários, todos paraguaios. E o nível da minha mão de obra lá, comparado com negócios que tenho no Brasil, é similar.

Outra coisa importante é que no Paraguai nós trabalhamos com duas moedas, o guarani e o dólar. Você movimenta a conta em dólar, pode pagar o funcionário em dólar. Temos zero preocupação com o câmbio. Já no Brasil, você sabe a dificuldade que é, principalmente para nós profissionais do agro, que importamos em dólar e vendemos em reais.

Parque industrial da Tecnomyl em Villeta, próximo a Assunção, no Paraguai
Parque industrial da Tecnomyl em Villeta, próximo a Assunção, no Paraguai| Divulgação / Grupo Sarabia

No seu livro, você diz que desistiu da Argentina por causa das dificuldades que o país impõe aos empreendedores…

Sim, eu desisti a Argentina por causa de complicações do governo. Achei melhor me retirar. Eu tenho experiência da Argentina, da Bolívia, do Paraguai e do Brasil. E para mim, sem dúvida nenhuma, o Paraguai é o país mais fácil de todos para se trabalhar. O Paraguai faz 80 anos que não muda a moeda, é o guarani. A inflação fica entre 5% e 7% todo ano. Não temos muita preocupação com o câmbio. Vai acontecer um dia? Pode acontecer, mas não aconteceu ainda.

Burocracia de 17 anos para autorizar negócios no Brasil

Suas empresas nasceram e criaram musculatura no Paraguai. Há cinco anos você está fazendo o caminho inverso, de empreender no Brasil. Demorou anos, no entanto, para conseguir se habilitar para atuar no nosso mercado de defensivos agrícolas. Isso se deve à burocracia?

Hoje, no Paraguai temos 28% de market share de defensivos agrícolas, enquanto a segunda empresa tem 14% ou 15%. No Paraguai, somos do tamanho das três maiores multinacionais que estão naquele mercado. Somos líderes absolutos, de longe. O nível do agricultor paraguaio não é pior do que o brasileiro. É do mesmo nível. Se somos líderes lá é porque temos qualidade. Nós começamos a fazer registro de patentes no Brasil em 2001. A nossa primeira venda foi em 2017, mas eu consegui ter uns 7 ou 8 registros só em 2019. Entrei no Brasil 17 ou 18 anos depois de começar um negócio. Nesse sentido, para você entrar no mercado de defensivos agrícolas brasileiro, é extremamente difícil.

Demorou todo esse tempo para ter registros aprovados e poder atuar em nosso mercado?

É isso. Com a aprovação da Lei 1.459/2022 [lei de modernização dos defensivos químicos], vamos viver uma nova realidade. O Brasil vai se tornar um país mais competitivo, o agricultor terá benefícios. Vai permitir maior competitividade tanto para empresas de pós-patente, como a nossa, como as multinacionais. As grandes multinacionais vão conseguir registrar mais rápido. É como o iPhone. Em algumas moléculas, o Paraguai e outros países que são mais rápidos nos registros já estão usando o iPhone 15. O Brasil ainda deve estar usando o iPhone 7 ou 8, porque está atrasado, as moléculas modernas não estão chegando.

No Brasil, os pesticidas, defensivos agrícolas, são chamados de agrotóxicos. No próprio termo, nós somos muito castigados. O registro é extremamente complexo, e quem paga essa complexidade é o agricultor, e, no final, é custo para o alimento. Mas eu diria que, por sorte, isso já ficou no passado. Foi uma grande luta do agro aprovação do PL 1.459. O Brasil tem agora uma legislação que vai permitir maior competitividade e que vai baixar o custo para o agricultor e, consequentemente, para o alimento.

Novas moléculas trazem toxidade menor

Isso envolve burocracia, mas também uma questão ideológica, não é? Há quem insista em enxergar as novas moléculas como mais ameaçadoras ao meio ambiente

É o contrário, no mundo hoje as pessoas querem alimentos com produtos com menor toxidade possível. As companhias já direcionam a pesquisa para essa área. As novas moléculas já vêm com toxidade menor. Isso é óbvio. Essa ideologia é falta de conhecimento.

Uma das primeiras apostas suas para entrar no Brasil foi comprar áreas de pastagens degradadas no Pará, e transformar em fazendas de grãos. Hoje muitos estão nesse caminho, mas você viu essa oportunidade antes. O Brasil ainda tem muitas oportunidades para o agronegócio expandir e ganhar mais musculatura?

Sem dúvida nenhuma. O Brasil tem aproximadamente 200 milhões de hectares de pastagens. De soja, nós temos 45 milhões de hectares. Se nós transformarmos 10% desses 200 milhões, poderíamos aumentar 50% a área de soja. Seria enorme, sem derrubar nenhuma floresta. Os números demonstram que 65% da área do Brasil está com áreas de matas nativas. Então acho que o Brasil é um exemplo para o mundo de controle ambiental. E podemos crescer em cima de áreas de pastagens degradadas.

E isso você já fez?

Isso eu já fiz. Áreas que eram pastagens degradadas e que hoje produzem 60 a 65 sacas por hectare. São fazendas com altíssimo potencial de produção, e eram pastagens com baixíssima produção pecuária.

Os irmãos Antonio, Paulo e José Marcos Sarabia ao lado do presidente paraguaio Santiago Peña (de camisa escura), durante inauguração de fábrica de sementes da Agrofertil em Hernandarias
Os irmãos Antonio, Paulo e José Marcos Sarabia ao lado do presidente paraguaio Santiago Peña (de camisa escura), durante inauguração de fábrica de sementes da Agrofertil em Hernandarias| Divulgação / Grupo Sarabia

Europa faz imposições injustas para agricultura brasileira

A lei antidesmatamento da União Europeia vai entrar em vigor no fim do ano, restringindo a entrada de produtos oriundos de áreas desmatadas depois de 2020, de forma legal ou ilegal. Talvez não precisássemos mesmo abrir novas áreas, porque já existem áreas degradadas. Mas a essa imposição de regras, como a gente pode reagir?

Acho que a Europa pede que os outros países do mundo façam o que ela não fez. Tirou boa parte de suas florestas para produzir alimento, e hoje quer que os países protejam aquilo que ela não protegeu. Acho que, de forma geral, já temos muita área aberta no Brasil. Mas, olhando por outro lado, aquele agricultor que comprou uma parcela, lá no Maranhão, por exemplo, que tem legalmente a possibilidade de abrir uma parte para produzir alimento, e não poder por causa de um pedido da Europa, eu não sei se isso é justo.

Quais são seus planos para o Brasil?

Nós hoje no Brasil temos 2,5% de market share e queremos chegar a 5% em quatro ou cinco anos. É um plano bastante ousado, mas acho que estamos preparados para isso. [Nota: neste ano, as empresas do Grupo Sarabia devem faturar R$ 2,5 bilhões no Brasil].

Suas empresas produzem genéricos de fórmulas conhecidas e também fazem novas formulações?

Não. Nós somos uma companhia de pós-patente. Procuramos produtos que não possuem mais patente e fazemos novas misturas, novos produtos. Temos aproximadamente 25 produtos que só nós temos no mundo, quem criou fomos nós. A Tecnomyl descobre que duas moléculas juntas, por exemplo, como a dipirona e o paracetamol, vão formar um terceiro produto, com melhor eficiência. Nós fazemos novos produtos com produtos pós-patente. As empresas de genéricos fazem o “control c” e o “control v” do computador. Vence a patente, elas vão lá e fazem o produto. Igualzinho, mesma formulação, só trocam o nome, e saem vendendo mais barato. Não é nossa filosofia. Queremos desenvolver coisas novas para o agricultor. Existem algumas coisas que nós desenvolvemos no Paraguai e que hoje já é usado no Brasil. Coisas que as grandes companhias não viram e que nós conseguimos enxergar.



Acesse esta notícia no site do Gazeta do Povo – Link Original

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